Baile Regencial no Brighton Pavilion

Eu fui a um baile em um palácio regencial. Ainda tenho dificuldade em acreditar que isso aconteceu. Estou há mais de duas semanas tentando encontrar palavras para descrever tudo o que vivi no meu primeiro baile histórico, mas, após contar tudo em uma live de mais de 1h30 no Youtube do Costura Histérica, resolvi tentar mais uma vez, sem medo deste artigo ficar quilométrico. Shall we? 

  1. Chegando a Brighton 
  2. Aquecendo os motores 
  3. Viajando no tempo
  4. Dance the night away
  5. Hora do banquete
  6. Mais um round de dança
  7. O Tour no Pavilion 
  8. Um jantar misterioso
  9. Prepare-se para o próximo baile

Chegando a Brighton 

Magnifico é a primeira palavra que vem a mente, mas vamos primeiro explicar do que estou falando. Trata-se do The Royal Pavilion Grand Regency Ball, organizado por Zack Pinsent, alfaiate histórico do Reino Unido e que encanta multidões com sua autenticidade e talento. Pinsent é um dos grandes influenciadores da costura histórica e já havia realizado bailes e outros eventos regenciais em sua cidade, a litorânea Brighton.

A pouco mais de uma hora de Londres, Brighton ficou muito famosa na Era Regencial graças ao favor do Principe Regente, futuro George IV. Por causa de suas inúmeras condições de saúde, a gota sendo apenas uma delas, a cidade no litoral inglês foi a escolhida para que George construísse o seu palácio de veraneio. 

Após terminar seu estábulo com minaretes e torres, começou-se um burburinho sobre como os cavalos do regente dormiam com mais estilo do que ele próprio. Então, Georginho começou a reformar novamente, com a ajuda de seu fiel arquiteto John Nash. 

Do lado de fora, o palácio ganhou verdadeiras gaiolas para criar o formato conico indiano com detalhes incríveis e que você não imaginaria ser apenas uma parte adicionada. Do lado de dentro, a paixão pela exótica e distante China dá o tom. Dragões, ouro, tapeçarias intrincadas e muitas ilustrações de trabalhadores chineses no século 17 e 18 decoram as paredes. 

E foi nesse palácio, que hoje pertence à cidade de Brighton e é um dos museus mais lindos que já visitei, que vivi o evento mais incrível de toda minha vida até aqui. 

Aquecendo os motores 

O Brighton Regency Festival começou propriamente na sexta-feira, com um sarau no Museu de Brighton e Hove. Como chegaria de Londres naquele dia, e já estava cansada de tantos dias acordando cedo e andando o dia todo (temos que visitar tudo, afinal, dormir em libra nâo dá), resolvi me permitir descansar na sexta-feira e economizar um pouco. 

Principalmente, porque no sábado de manhã já teríamos a nossa primeira agenda: uma aula de danças regenciais. 

Aproveitei a manhã para fazer parte do meu cabelo, assim teria mais tempo para secar nos rolinhos. E lá fui eu vestida como uma maluca, calça moletom, sueter, meia fina e sapatilha, bobes no cabelo e um pano para cobrir tudo.

Num primeiro momento, a insegurança bateu forte ao entrar no salão do hotel e ver muitas pessoas vestidas com roupas regenciais. Após ir e voltar três vezes até as escadas, pensando se subia e vestia uma roupa regencial, venci a insegurança e decidi ficar ali mesmo, vestida daquele jeito. A noite seria o momento de brilhar, ali era apenas uma aula. Contenha-se, Emanuellen! 

Logo, mais pessoas começaram a chegar, muitas vestidas como “civis”, então consegui controlar a ansiedade. E depois que a aula começou, não sobrou tempo para nada. As danças são realmente vigorosas e é preciso muita atenção para decorar todos os passos. 

Comparando com uma dança moderna, os movimentos são de fato menos complexos. Porém, a quantidade de passos e voltas e allamande, e poussots e promenades, entre outros nomes que eu deveria aprender foram me deixando cada vez mais confusa e ao final eu estava apenas seguindo meus parceiros mais descolados na arte da dança regencial. 

Com as panturrilhas queimando, mas extremamente feliz, aprendi uma valsa, um cottilion, uma quadrille e mais algumas outras danças que infelizmente não me lembro o nome – nem os passos. 

De volta ao quarto, hora da transformação. Terminei cabelo e maquiagem, vesti as infinitas camadas de roupa, mas que foram preciosas para segurar o frio longe dos meus ossos brasileiros, e parti rumo ao Brighton Pavilion. Era por volta das 16h, mas estamos falando do inverno britânico, onde o sol se põe antes das 17h e eu queria muito tirar fotos com a luz do dia em frente ao palácio. 

Estava sozinha e ainda não havia feito muitos amigos que pudessem tirar fotos de mim. A verdade é que ainda estava um pouco – sóbria – timida, então fiz minhas fotos sozinhas, com o disparador em sequência. Definitivamente, não são os melhores cliques, mas registrei meu casaco incrível feito pelo Paulo Samu naquele edificio tão iconico e a minha alegria infantil de estar ali. 

Viajando no tempo

Adentrando o palácio, o sonho de uma noite de inverno começou pra valer. Já na entrada, as mulheres recebiam um kit com um leque, um pequeno cartão de danças e um lápis para anotar os nomes dos pretendentes. Meu cartão segue vazio, mas não por falta de parceiros de dança – mas sim porque tudo é uma lembrança daquele lugar e jamais iria escrever algo ali. 

Entrando no Red Drawing room, o choque de realidade bateu – ou melhor, de surrealidade. Para qualquer lugar que eu olhasse, via apenas pessoas diretamente de 1815 ou algo assim. A música suave era envelopada pelo barulho de pessoas conversando em inglês, com diversos sotaques e tons. O espumante estava sendo servido em nada menos do que xicaras de chá e eu não pude deixar de fazer a piada “That´s really my kind of cup of tea” para os novos amigos que fiz. Provavelmente, ao verem o quão de boca aberta eu estava, eles perceberam que era minha primeira vez e me chamaram pra conversar. Um casal da Finlândia e outro casal do mundo – amei que eles disseram que não trabalham com nacionalidades – me fizeram companhia nessa primeira etapa da festa. 

Enquanto anoitecia, mais pessoas chegavam à sala de recepção e realmente o local começou a ficar quente. Fugindo para a chapelaria, tirei meu casaco e voltei pronta para bailar com meu vestido xadrez, feito com muito orgulho por mim mesma, numa máquina que se eu mostrar ninguém acredita que costurei com aquilo. 

Logo fomos direcionados para o Music Room, a sala mais majestosa do Brighton Pavilion na minha opinião, com lustres imensos, um órgão ao fundo e muitas decorações luxuosas. Novamente, eu só conseguia ficar de boca aberta, absorvendo tudo aquilo que estava vivendo. 

Dance the night away

O baile começou com um desfile dos casais que iriam dançar e eu me senti totalmente em um livro de época. Então, a primeira dança por sorte foi a valsa que aprendi na aula mais cedo. Ainda me confundi um pouco nos passos, acabei na ponta da fila – posição que não fazemos nada durante boa parte da dança. Fiquei confusa achando que tinha sido deixada de fora, mas na verdade era daquele jeito mesmo. De qualquer forma, aproveitei muito e me senti sorrindo o tempo todo de tanta felicidade.

A segunda dança foi um cottilion – eu acho – ou uma quadrille. Foi muito divertido e eu estava começando a pegar os passos. Mas as danças são realmente vigorosas, com muitos pulinhos e meio-passos que deixa a perna pegando fogo. Não à toa as mocinhas nos livros desmaiavam ou precisavam fingir um tornozelo torcido para descansar. 

Dancei mais algumas musicas que nem me lembro, e cedo demais chegou a hora do jantar. Acabei sofrendo o destino de muitas heroínas de época: fiquei sem par para a procissão até a sala de jantar. Porém, novamente para me salvar, o meu segundo parceiro de dança estava bem atrás de mim, com uma das amigas que fiz de manhã na aula de dança. A essa altura, eu apenas sabia o nome das pessoas, trocando instagram mas sem tempo para de fato olhar a presença online dessa gente. Ocupada demais para olhar o celular, tenho certeza que vocês entendem. Ele, gentilmente, sugeriu que eu aceitasse seu outro braço, claro, se eu e a outra garota não nos importássemos. Uma cena tirada diretamente de algum livro da Julia Quinn ou Mary Balogh! 

Hora do banquete

No Banqueting Room, fomos direcionados para suas respectivas mesas, cada uma nomeada em homenagem a uma personalidade regencial. A minha era Mary Shelley. Então, enfim o jantar tipicamente regencial começou.

A entrada foi uma terrine de carne de caça com legumes e verduras, bem mais gostoso do que eu poderia imaginar. O prato principal consistia em uma carne cozida com legumes, com um bolinho de haggis e alguns vegetais. Para quem não sabe, haggis é um prato tipicamente escocês, feito com entranhas de ovelha. O bolinho de haggis é uma versão moderna, com o patê de entranhas envolto em carne, empanado e frito. Parecia um bolinho de carne e se eu não tivesse lido que era haggis, não teria percebido (afinal, eu nunca comi, então não saberia que gosto tem). A minha filosofia é sempre coma primeiro, pergunte depois. Então, a experiência foi ótima! 

Inclusive, após o jantar, o anfitrião Zack Pinsent leu o poema Address to a Haggis, de Robert Burns, homenageado da noite, pois no dia 25 de janeiro marcou-se o 200° aniversário do poeta. Um brinde com uisque legitimamente escocês, que queimou minha alma, e voltamos todos para o salão de baile, onde alguns convidados já estavam dançando. 

Mais um round de dança

Totalmente letárgica após uma deliciosa refeição, mas não querendo perder nada, voltei à pista com menos energia do que eu deveria – ou poderia – momento. Porém, logo a diversão tomou conta novamente e eu estava dançando e rindo como uma criança. Muito fácil me agradar,rs. 

Um dos pontos que mais lembro dessa noite foi uma dança que me deixou totalmente confusa, quando meu parceiro começou a bater palmas como brincando de adoleta. Olhei para ele e apenas comentei que não haviam ensinado essa na aula mais cedo, só para confirmar que eu não estava alucinando. E não, essa não havia sido ensinada. 

Logo peguei o jeito da coisa, que só posso explicar com o video abaixo como funciona essa dança, chamada Lord Byron’s Maggot. 

Se eu já tinha achado aquela dificil, depois ainda enfrentei a ciranda de La Boulanger, na qual a mulher precisa girar alternadamente com seu parceiro e com o homem que estiver em sentido horario. Eu já estava tonta demais, de comida, bebida e felicidade, para conseguir seguir os passos corretamente, e apenas ria entusiasmada, me desculpando pela confusão. 

Após essa festança toda, o nosso tempo no museu acabou. Mas, a festa continuou em um pub em frente ao palácio, e por mais algumas horas da madrugada, até que às 5 da matina cheguei em casa. Milagrosamente, tirei os grampos, tiara e aplique do meu cabelo, lavei o rosto e caí na cama em um sono divino. 

O Tour no Pavilion 

A hora de acordar chegou cedo demais pra alguém que havia acabado de dormir. Mas, a ressaca nunca pareceu tão deliciosa. Aos trancos e barrancos, coloquei um vestido floral “civil” e o casaco preto histórico, pois não iria perder a chance de fazer mais algumas fotos com ele. Ainda bem, pois quando cheguei no Brighton Pavilion todos estavam vestidos perfeitamente com seus trajes de dia para o tour. 

E que tour delicioso! Passear pelos corredores internos do palácio foi algo incrivel, conhecer tuneis e saletas nos quais centenas de pessoas passaram em seus dias, levando comida e outros mantimentos daqui pra lá foi como pisar em mais uma parte desse sonho regencial. 

Após o tour, que incluia a suite do Principe Regente, com direito a passar por trás das cordas do museu e adentrar uma porta escondida na parede, chegamos ao andar do salão de chá. Ali ainda vimos a suite da amante de George e a sala onde os empregados deveriam dormir. 

No salâo de chá propriamente, taças de espumante nos esperavam para brindar mais um dia de diversões. Aonde quer que se olhasse, parecia que viajantes do tempo haviam inundado o local. Aos poucos, as mesas foram ficando mais cheias e espalhafatosas, com casacos de todas as cores, penas esvoaçantes e casacos de pele. Afinal, o clima lá fora estava inclemente.

Os convidados então ficaram livres para tirarem fotos pelo pavilhão e irem para suas casas/hotel. Alguns afortunados ainda tinham mais um compromisso. 

Um jantar misterioso

A adega do Old Ship Hotel escondia um segredo. Zack havia preparado tudo para um jantar secreto com convidados, e eu dei sorte de encontrar um lugar para mim. A atmosfera estava incrível e, mesmo cansada, pude aproveitar mais um pouco da hospitalidade regencial do nosso anfitrião. À luz de velas, a antiga adega estava sombriamente quente, cheia de risadas e conversas. 

Após o jantar, estava oficialmente encerrado o fim de semana de atividades para mim. Mas, na segunda-feira, alguns sortudos ainda foram à Ópera, com direito a um tour exclusivo nos bastidores do teatro. 

Prepare-se para o próximo baile

O próximo Brighton Regency Festival já foi anunciado: de 05 a 10 de fevereiro de 2026. Ainda não há informações sobre quando os ingressos começarão a ser vendidos, mas geralmente o anúncio é feito pelo Instagram Pinsent Tailoring, e agora provavelmente também pela página oficial do evento.

O lado bom é que com tanta antecedência é possível se planejar financeiramente para uma viagem dessas. Uma dica é começar a comprar moeda (libra) em algum serviço como Wise ou Nomad. Na hora em que as vendas começarem, você já tem o dinheiro para pagar. As passagens de aviâo e hotel podem ser reservados no segundo semestre, então o mais importante é garantir o valor dos ingressos.

E o interessante do festival é que foi possível escolher quais eventos você queria participar e pagar individualmente – também havia pacotes especiais. Somente o ingresso do baile custou 270 libras. A aula de dança custou 20 libras, e o tour e chá da tarde foram 135, juntos. Imagino que os preços para 2026 sejam ajustados, mas já é possível ter uma base.

Fiquei em um hotel muito confortável e que definitivamente não era uma das opções mais baratas, mas resolvi me mimar. E o local não decepcionou, o Old Ship Hotel já ocupa o lugar de estadia mais confortável da viagem. Mas é possível encontrar opções para todos os gostos.

Se você quer fazer parte do grupo que vai viajar para Brighton em 2026, preencha esse formulário que entrarei em contato explicando como funciona o meu serviço de guiamento e tudo o que podemos incluir no planejamento dessa viagem para fazer desse momento ainda mais inesquecível.

Uma verdadeira viagem regencial no século 21!

Confira algumas fotos desse fim de semana mágico:

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